Este blog foi impulsionado pela SPEM – Sociedade Portuguesa de Esclerose Múltipla, e pretende ser um espaço onde se
entornem discussões, novidades, perguntas, respostas, conversas, histórias e viagens – em redor da vida com Esclerose
Múltipla e Outras Coisas Também.









sábado, 15 de dezembro de 2012

Nos entretantos, o corpo

Não sei se é do calor ou dos trabalhos de bricolage e carpintarias (sim, sim, os livres têm sido ocupados a pintar móveis comprados em promoção, montagem de tomadas eléctricas e sistemas variados, restauração de velharias apanhadas na rua e conserto de outras tantas coisas), mas tenho sentido o corpo inquieto.

Se cruzo a perna, deixo de a sentir aos cinco minutos, a mão anda ansiosa e fugitiva, e quer escorregar até ao fim da linha antes de cumprir com as letras que a mente comanda, e o braço também quer correr, galopar ao vazio, mas está quieto e repousado e se revolta por dentro, como latejando. 

Tenho um burburinho sussurrando nos dedos, encurralado entre o desassossego e moleza natural dos dias quentes de janela aberta. De noite estico o corpo e sinto uma multidão em marcha nos músculos, como se estivesse correndo, como precisasse correr, e parada não consigo porque me efervesce a carne.

Tenho uma multidão que me corre as pernas em hora de ponta, quietas mas não sossegadas, gritando e apregoando em voz muda, como um mercado em frenesim sem som.

Felizmente, tenho também um Rodolfo, que acorda cansado comigo porque que fica comigo acordado nestas noites de multidão pelos veios das pernas, pelas vias da mão, e me adormece o burburinho e me acalma o desassossego dos músculos até a multidão dispersar, até eu cair de sono e, comigo, as dores da multidão que me corre pela pele.

Sorte não é não ter EM, não ter surtos, não ter dores, ter viagens, ter aventuras, ter palavras que enchem vazios, que a cada um lhe cabe o que lhe toca e a vida vai chovendo como pode.

Sorte é ter um "rodolfo" nas noites de dilúvio de bichos carpinteiros e multidão, que correm as pernas paradas e voam as mãos quietas como se a carne estivesse a acontecer por trás do que os olhos não vêem nem sente o coração.

8 comentários:

B. disse...

Por idiota que pareça, isto merecia era um "gosto". Porque nada há que se possa ou, podendo, que valha a pena dizer. Valha-nos a sorte :) um beijo Catarina

Numa qualquer toalha de mesa disse...

é brilhante a escrita do último parágrafo.

Anónimo disse...

A minha irmã dizia que tinha estrelas nas pernas. E naquele sorriso manso em que nos falava dum mistério, eu via-a brilhar.

Anónimo disse...

Rodolfo?

Voando noite fora ao som de guizos?

Voando noite fora ao som de guizos!

Voando noite fora ao som de guizos...

L.A

Anónimo disse...

Olá, Olá!!!!

Tive conhecimento do seu blog e tive que vir dar uma espreitadela....Parabéns!É excelente!!
Parabéns por ter conseguido fazer a sua viagem que continua, continua....
Um grande beijinho!! Boa sorte para a sua jornada!
P. Eirinha

SR disse...

Bem hajas Catarina!
Pela forma divertida que escreves o que de pouco divertido existe na EM.
Pela forma descomplicada que descreves o complicado, que todos nós sentimos mas não temos a capacidade de explicar. Como o cansaço atroz que nos invade sem que tenhamos andado a correr a maratona, ou o que qualquer distrurbio emocional nos causa.
Só um ser iluminado, escreve da maneira que tu o fazes!
Mais uma vez obrigada pela tua partilha

Anónimo disse...

porra.
magnífico rodolfo, como magnífico é o elogio, em forma e conteúdo.
não poucas vezes lembro-me e rezo por ti e outro.

Anónimo disse...

porra.
magnífico rodolfo, como magnífico é o elogio, em forma e conteúdo.
não poucas vezes lembro-me e rezo por ti e outro.